sábado, 25 de junho de 2011

Amizade

   Entendemo-nos bem. Eu deixo-o ir à sua vontade e ele leva-me sempre onde eu quero.
   Platero sabe que, ao chegar ao pinheiro da Coroa, gosto de me aproximar do tronco, acariciá-lo e olhar o céu através da sua enorme e clara copa; sabe que me deleita o caminhito que leva, entre a relva, até à Fonte velha; que é para mim uma festa ver o rio do alto da colina dos pinheiros, evocadora, com seu bosquezinho elevado, de clássicas paragens. Se dormito, confiado, em cima dele, o meu despertar abre-se sempre para um desses amáveis espectáculos.
     Trato Platero como se fosse um menino. Se o caminho se torna fragoso, e lhe custa um pouco, desmonto para aliviá-lo. Beijo-o, engano-o, faço-o afirmar...Percebe bem que o amo e não me guarda rancor. É igual a mim, tão diferente dos outros, que cheguei a pensar que sonha os meus próprios sonhos.
   Platero rendeu-se-me como uma adolescente apaixonada. De nada protesta. Sei que sou a sua felicidade. Até foge dos burros e dos homens....



Juan Ramón Jiménez. Platero E Eu. Tradução de Luís Lima Barreto. Edições Cotovia, Lisboa, 2007, p.62

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