domingo, 18 de julho de 2010

VII

Vento do Sul


O mar para Oeste se confunde com a linha das montanhas.
A nossa esquerda, o vento do Sul sopra deixando-nos loucos,
Esse vento que descarna os ossos,
Entre os pinheiros e as alfarrobeiras, nossa casa.
Grandes janelas. Grandes mesas
Para escrever as cartas que te havemos escrito
Desde há tantos meses, e que lançamos
Ao centro da separação, para a igualar.
Estrela da aurora, quando baixavas os olhos
Nossas horas eram mais doces que o azeite
Na chaga, mais ligeiras que a água fresca
No palácio, mais plácidas que a penugem do cisne.
Sustentavas nossa vida em tua mão.
Depois do pão amargo do exílio.
Se permanecemos à noite diante a parede branca
Tua voz nos chega como a esperança duma chama;
E esse vento de novo
Afia sua lâmina em nossos nervos.
Escrevemos-te cada qual as mesmas coisas
E cada qual fica silencioso diante o outro
A olhar cada qual para si, o mesmo mundo,
Trevas e claridade sobre a linha das montanhas
E tu.
Que espantarás esta tristeza de nossos corações?
Ontem à noite, um aguaceiro e hoje
Pesa de novo o céu encoberto. Nossos pensamentos
Como as agulhas de pinheiro, amassadas, inúteis
À porta de nossa casa, sob o aguaceiro de outrora,
Esforçam-se por levantar uma torre que desaba.
Nessas aldeias dizimadas,
Sobre o cabo entregue ao vento do Sul
Com esta linha de montanhas diante de nós, que te oculta,
Quem nos creditará por nossa vontade de esquecimento?
Quem neste fim de outono acolherá nossa oferenda?



Giorgos Seferis. Poemas. Trad. de Darcy Damasceno. Estudo introdutivo de C. TH. Dimaras. Editora Opera Mundi. Rio de Janeiro, 1973., p. 57/8

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