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domingo, 9 de março de 2014
O BELO VERSO
Apetecia-me escrever um belo verso.
Sonoro, elegante, correcto, de mármore!
Nele pôr o que outros me inspirassem.
O que ali aquele poeta estava cantando.
Ele o cantava e eu o repetia.
Acrescentava, desdobrava, acrescia da minha
[ansiedade.
Mas verso bem feito!
Cheio do que se sonha, não do que se sente.
Parece-me pobre o que sinto.
E vulgar.
Estes olhos que sem querer se envidraçam,
[fúteis, sem recato, infantis, esta
[voz insegura, enfim, tudo isto...
Que figura iriam fazer dentro de um verso ele-
[gante, lapidar?
Belo verso, trair-te-iam, roubar-te-iam toda a
[graça e até a ressonância, o êxtase
[e aquela espécie de embalo que ao
[espírito sempre dás.
Mas sinceramente me apetecia escrever um
[verso de mármore belo!
Tudo, tudo por causa daquele poema...»
Irene Lisboa. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 157
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