sexta-feira, 26 de abril de 2024


 Sede da Pide-Lisboa, 26 de Abril de 1974

Fotografia Eduardo Gageiro

segunda-feira, 15 de abril de 2024



PEQUENO POEMA

Serra-Mãe, 7 de Março de 1945.


Quando eu nasci,
Ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais…
Somente,
esquecida das dores
a minha Mãe sorriu e agradeceu.

Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
Não enlouqueceu ninguém…
Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe…


Sebastião da Gama

 
(...)

Fêmeas somos
fiéis à nossa imagem

oposição sedenta que vestimos
mulheres pois sem procurar vantagem
mas certas bem dos homens que cobrimos

E jamais caça
seremos

ou objecto
dado

nem voluntário odor
de bosque seco



Novas Cartas Portuguesas (Edição Anotada) de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Organização de Ana Luísa Amaral. Publicações Dom Quixote. 1ª Edição: 1972. 3ª Edição anotada, janeiro de 2017. p. 30/31

''A mente escreve e mente.''

 Novas Cartas Portuguesas (Edição Anotada) de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Organização de Ana Luísa Amaral. Publicações Dom Quixote. 1ª Edição: 1972. 3ª Edição anotada, janeiro de 2017. p. 26

 

por acinte
de propósito, de caso pensado

''Atenta, pois, nisto: o perigo de nos querermos ou nos negarmos.''

 Novas Cartas Portuguesas (Edição Anotada) de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Organização de Ana Luísa Amaral. Publicações Dom Quixote. 1ª Edição: 1972. 3ª Edição anotada, janeiro de 2017. p. 21

''mulher parida e laureada
           escreve mas não pula''

Novas Cartas Portuguesas (Edição Anotada) de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Organização de Ana Luísa Amaral. Publicações Dom Quixote. 1ª Edição: 1972. 3ª Edição anotada, janeiro de 2017. p. 6

 

baixar a grimpa
abater o orgulho, submeter-se, sujeitar-se
levantar a grimpa
ensoberbecer-se, reagir
«Sei que te perdi e me afundo, me perco também dentro da minha total ausência de poder em que me queiras.»
 E assim sofro, aparentemente porque te amo, mas antes porque perco o motivo de alimento da minha paixão, a quem talvez bem mais queira do que a ti.
  Do desvario não me curo, nem da ansiosa vontade de ver.

(...)

2/3/71

Novas Cartas Portuguesas (Edição Anotada) de Maria Isabel Barreno, Maria Velho da Costa e Maria Teresa Horta. Organização de Ana Luísa Amaral. Publicações Dom Quixote. 1ª Edição: 1972. 3ª Edição anotada, janeiro de 2017. p. 5


"Putas ou lésbicas, tanto nos faz que nos nomeiem, desde que se lute e não se perca"/"Chegou a hora de dizer basta. E formarmos um bloco com os nossos corpos". (in "Novas Cartas Portuguesas")


Compared to What?

I love the lie and lie the loveA-Hangin' on, with push and shovePossession is the motivationthat is hangin' up the God-damn nationLooks like we always end up in a rut (everybody now!)Tryin' to make it real, compared to what? C'mon baby!
Slaughterhouse is killin' hogsTwisted children killin' frogsPoor dumb rednecks rollin' logsTired old lady kissin' dogsI hate the human love of that stinking mutt (I can't use it!)Try to make it real, compared to what? C'mon baby now!
The President, he's got his warFolks don't know just what it's forNobody gives us rhyme or reasonHave one doubt, they call it treasonWe're chicken-feathers, all without one nut. God damn it!Tryin' to make it real, compared to what? (Sock it to me)
Church on Sunday, sleep and nodTryin' to duck the wrath of GodPreacher's fillin' us with frightThey all tryin' to teach us what they think is rightThey really got to be some kind of nut (I can't use it!)Tryin' to make it real, compared to what?
Where's that bee and where's that honey?Where's my God and where's my money?Unreal values, crass distortionUnwed mothers need abortionKind of brings to mind ol' young King Tut (He did it now)Tried to make it real, compared to what?!
Tryin' to make it real, compared to what?
Donald Dean, Leroy Vinnegar, Benny Bailey, Eddie Harris





"
Compared to What" is a protest song written by Gene McDaniels. It was recorded by Roberta Flack in February 1969 for her debut album First Take, but became better known following a performance by Les McCann (piano and vocals) and Eddie Harris (tenor saxophone) at the Montreux Jazz Festival in June of that year. 


As Horas de Maria 

 Os Abismos da Meia-Noite


António de Macedo (1931-2017)

quinta-feira, 11 de abril de 2024

Lena d'Água - O que fomos e o que somos


O que fomos e o que somos Já pouco reconhecemos A correr atrás de sonhos Tantos erros cometemos É algo que não se explica O amor que ainda temos No azar que lamentamos No tempo que nós perdemos No escuro em que mergulhamos Há sempre uma luz que vemos E é nessa maravilha Que nós dois ainda cremos E queremos lá saber Qual a sorte que nos espera Dia a dia na rotina Vir a tona e respirar Há sempre uma primavera Quando o inverno passar E ainda nos perguntamos Como é que isto aconteceu Dias, meses, foram anos E ninguém se apercebeu Que por nós passou a vida E o "nós" permaneceu Sinto ainda no meu peito Quando olhas para mim Sei que o caminho perfeito Só pode ser feito assim Com a tua companhia Isto nunca vai ter fim E queremos lá saber Qual a sorte que nos espera Dia a dia na rotina Vir à tona e respirar Há sempre uma primavera Quando o inverno passar

terça-feira, 9 de abril de 2024

Minha mãe


Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada
Quem tem uma mãe tem tudo
Quem não tem mãe não tem nada *

Quem não tem mãe não tem nada
Quem a perde é pobrezinho
Ó minha mãe minha mãe
Onde estás que estou sózinho

Estou sózinho no mar largo
Sem medo à noite cerrada
Ó minha mãe minha mãe
Ó minha mãe minha amada


* Quadra popular


«(...), não imaginei que a ela se lhe esgotasse tão depressa o sentimento que dizia sentir por mim, nem que se lhe começassem a esfriar os suspiros, e que o seu coração se fosse dar a outro.» 

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 130

 « - Pai, mataram-nos.
- A quem?
- A nós. Ao passar o rio. Crivaram-nos de balas até que nos mataram a todos.»


Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 107

« - Aprende isto, filho: no ninho novo tem que se deixar um ovo. Quando a velhice te rondar, aprenderás a viver, saberás que os filhos abalam, que não te agradecem nada; que comem até a tua lembrança.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 105

 « - Não encontro que dizer, pai, até o desconheço. O que é que ganhei com o facto de você me ter criado? Só trabalhos. Só me trouxe ao mundo e desenrasca-te como puderes. Nem sequer me ensinou o ofício de fogueteiro, pra que não lhe fizesse sombra. Vestiu-me uns calções e uma camisa e lançou-me nos caminhos pra que aprendesse a viver por minha conta e quase me punha na rua de sua casa com uma mão à frente e outra atrás. Olhe, o resultado é este: estamos a morrer de fome. A nora e os netos e este seu filho, como quem diz, toda a sua descendência, estamos quase a desistir e cair bem mortos. E a raiva que dá é que é de fome. Você acha que isto é legal e justo?»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 104

 «San Juan Luvina. Aquele nome soava-me  a nome de céu. Mas aquilo é purgatório. Um lugar moribundo onde até os cães morreram e já não há nem quem ladre ao silêncio; pois assim que uma pessoa se acostuma ao vendaval que ali sopra, não se ouve senão o silêncio que há em todas as solidões. E isso acaba cm uma pessoa. Olhe para mim. Acabou comigo. Você que vai para lá depressa compreenderá o que lhe digo...»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 97

«Dura o que tiver de durar.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 97

«Vê-los-á passar como sombras, colados às paredes das casas, quase arrastados pelo vento.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 97

''bagaços de acácia''

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 97

 «Mas, se nós abalarmos, quem levará os nossos mortos? Eles vivem aqui e não os podemos deixar sozinhos.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 96

 «Mostraram os dentes tortos e disseram-me que não, que o governo não tinha mãe.»

Juan Rulfo. A planície em chamas. Tradução do original de Ana Santos. Cavalo de Ferro, 1ª edição, 2003., p. 96

Love is Blind


Love is blindLove is only sorrowLove is no tomorrowSince you went awayLove is blindHow well I rememberIn the heat of summer pleasureWinter fades
How long will it takeBefore I can't rememberMemories I should forgetI've been burningSince the day we met
Love is blindLove is without a mercyLove is "now you've hurt me"Now you've gone away"Love is blindLove is no horizonAnd I'm slowly dyingHere in yesterday
In the morningWaking to the sound of weepingSomeone else should weep for meNow it's overLover, let me be
Love is blindLove is your caressLove is tendernessAnd momentary painLove is blindHow well I rememberIn the heat of summer pleasureWinter fades

Compositores: Janis Ian
Acerca do sofrimento, nunca se enganaram
Os Velhos Mestres: quão bem entenderam
A condição humana; como está presente
Enquanto alguém se alimenta ou abre uma janela ou monotonamente segue a caminhar;
Como, enquanto os velhos esperam apaixonada e reverentemente
Pelo miraculoso nascimento, deve sempre haver
Crianças que não queriam especialmente que acontecesse, patinando
Num lago na orla da floresta:
Nunca esqueceram
Que até o mais terrível martírio deve seguir o seu curso,
Custe o que custar, a um canto, nalgum lugar descuidado
Onde os canídeos acorrem em suas vidas de cão, e o cavalo do torturador
Coça seu inocente traseiro por detrás de uma árvore.

No Ícaro de Brueghel, por exemplo: como tudo se afasta
Ociosamente do desastre; o lavrador poderá
Ter ouvido o splash, o grito desamparado,
Mas para ele não era um importante fracasso; o sol brilhou
Como soía sobre as pernas brancas que desapareceram na verde
Água; e o frágil e grandioso navio que deve ter avistado
Algo espantoso, um rapaz caindo do céu,
Tinha um destino para ir e afastou-se calmamente.

João Luís Barreto Guimarães

“Musée des Beaux Arts”, de W. H. Auden


Não cultives a fraqueza



Vive o fraco na fraqueza
o bom na sua bondade
vive o firme na firmeza
lutando por liberdade.

Não cultives a fraqueza,
procura sempre ser forte,
que o homem que tem firmeza
não se rende nem à morte.

Educa a tua vontade
faz-te firme: em decisões,
que não terá liberdade
quem não fizer revoluções.

Se queres o mundo melhor
vem cá pôr a tua pedra,
quem da luta fica fora
neste jogo nunca medra.


Francisco Miguel Duarte,

Poeta popular nascido no Alentejo,

Operário sapateiro, filho de camponeses
''Legisladores ou revolucionários que prometem simultaneamente a igualdade e a liberdade são sonhadores ou charlatães.''

sábado, 6 de abril de 2024

"perdido por cem, perdido por mil"

O cine-olho de vários cineastas

 Vertov e Godard, Fellini e Visconti, Glauber e Guzman, Fassbinder e Pasolini, Ozu e Cassavetes, Orson Wells e Eisenstein, G.Reggio e Carmelo Bene, Rouch e Ivens, Wiseman e Farocki

'' as estátuas de pássaros e de reis''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 97

 ''Retiramos o teu véu, e a visão dos teus olhos é penetrante.''

Alcorão


Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 96

'' Recebia muitas visitas de gente recém-morta''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 86

 « - Para morrer basta estar vivo - disse uma do grupo, e outra, pensativa, também:

- Tanta soberba o homem, e não serve senão para juntar moscas!»


Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 81

''Morreu debaixo do chapéu, sem um queixume.''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 81

 ''Tive a coragem de sentir que não éramos ninguém.''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 78

''Chupava com raiva o cigarro''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 76

 «Sempre é de noite e há pequenas pias de pedra, e a felicidade desse paraíso é a felicidade peculiar das despedidas, da renúncia e dos que sabem que dormem.»

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 71


                                                 Arrivée de Juifs à Auschwitz en 1944

Caro Mio Ben // Giuseppe Giordani

Caro mio benCredimi almenSenza di teLanguisce il cor
Caro mio benSenza di te languisce il cor
Il tuo fedelSospira ognorCessa, crudel, tanto rigorCessa, crudel, tanto rigor, tanto rigor
Caro mio benCredimi almenSenza di te languisce il cor
Caro mio benCredimi almenSenza di teLanguisce il cor

terça-feira, 2 de abril de 2024

 ''Delegava as fadigas de governar em seis ou sete adeptos.''


Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 70

'' no coração agitado das batalhas''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 69

segunda-feira, 1 de abril de 2024

Fotógrafa Maria José Palla

Fotografar é sempre expor-se, é sempre revelar o interior de si próprio, o seu pensamento, os seus gostos, os seus sentimentos. Esta exposição é essencialmente o resultado de um ritual de passagem, de uma perda, o fim de uma época:




«j'ai parcouru les mondes/et jai perdu mon vol dans leurs chemins lactés/aussi loin que la vie, en ces veines fécondes/ répand des sables dor et des flots argentés»

Gérard de Nerval




''O meu trabalho é subjectivo. Conto o que se passa dentro de mim. Depois de várias séries de auto-retratos, interrogo-me agora sobre a duração do tempo, tempo relativo para cada um, tempo apreendido de maneiras diferentes, constantemente contabilizado e efémero.

Países atravessados, estradas percorridas, perco-me numa vaga possibilidade de conseguir a paragem do tempo, ou a eternidade imóvel, nas palavras de Santo Agostinho.

A arte é uma actividade contra a morte, uma luta contra a passagem do tempo, uma maneira de exorcizar a eternidade.

Esta exposição tem uma relação estreita com o fim de uma casa e de um país. Somos viajantes, emigrantes, exilados. Deslocamo-nos e instalamo-nos pelo mundo fora. Recentemente a minha amiga Olga Pombo percorrendo em voz alta Horácio, na sua quinta, leu-me uma passagem que diz que o “tempo passa tão depressa como as nossas palavras”.''



''I’m not afraid of the darkness outside. It’s the darkness inside houses I don’t like.''

 Shelagh Delaney
 



Que Cisne É Belo

“Que água é calma como as fontes
mortas de Versalhes.” Que cisne,
de olhar cego em soslaio e
pé gondoleiro, é belo como o
de chinfrim porcelana e tisne
no olhar e ouro dentado
na coleira a mostrar quem lhe é o dono.

Cravado à árvore-lucerna
de Luís Quinze com botões de uma
cor de crista de galo,
dálias, ouriços, semprevivas,
ele se empoleira na espuma
de esculpidas, polidas
flores – calmo, alto. O rei é morto.

Tradução de Adriano Scandolara

Não Há Cisne Tão Lindo

“Não há água tão quieta quanto as
fontes mortas de Versailles.” Não há cisne,
de olhar cego bistre oblíquo
e pernas gondoleantes, tão lindo
quanto o de louça com chintz,
de olhos cor de corça e coleira
de ouro denteada a indicar de quem foi.

Alojado no candelabro de
Luís XV, com botões de matiz de
crista-de-galo, com dálias,
ouriços-do-mar e sempre-vivas,
no mar de ramalhetes de
polidas e esculpidas flores
ele pousa – livre e altivo. O rei é morto.

Tradução de José Antonio Arantes

No Swan So Fine

“No water so still as the
dead fountains of Versailles.” No swan,
with swart blind look askance
and gondoliering legs, so fine
as the chinz china one with fawn-
brown eyes and toothed gold
collar on to show whose bird it was.


Lodged in the Louis Fifteenth
candelabrum-tree of cockscomb-
tinted buttons, dahlias,
sea-urchins, and everlastings,
it perches on the branching foam
of polished sculptured
flowers–at ease and tall. The king is dead.

Marianne Moore

O Cardume de Peixes

passa o
jade baço.
Dentre os mexilhões de um azul-gralha,
um ajusta a borralha;
se abre e cerra, um leque que houvesse

sido,
pois, ferido.
A craca encrusta os lados da onda,
embora não a esconda
lá, que o feixe imerso de dardos do

sol,
como o rol
de vidro em fibra, veloz fulgura
por cada rachadura –
entrando e saindo, iluminando

o
mar azul-
-turquesa de corpos. A água crava
férrea cunha na trava
férrea do penhasco; onde os astros,

rosas
grãos de arroz, as
tintas águas-vivas, o siri
qual verde lírio e
cogumelos marinhos deslizam.

As
máculas
de abusos estão presentes nisso,
esse audaz edifício-
toda característica física

de a-
-cidente há-
a ausente cornija, as queimaduras,
machadadas, ranhuras
de bombas se destacam; morreu a

fossa,
que reforça
todas as provas de que ele vive
do ser que não revive
seu viço. Envelhece o mar nisso.

Tradução de Adriano Scandolara


Os Peixes
vade-
ando negro jade.
Das conchas azul-corvo, um marisco
só ajeita os montes de cisco;
no que vai se abrindo e fechando

é que
nem ferido leque.
Os crustáceos que incrustam o flanco
da onda ali não encontram canto,
porque as setas submersas do

sol,
vidro em fibras sol-
vidas, passam por dentro das gretas
com farolete ligeireza –
iluminando de vez em

vez
o oceano turquês
de corpos. A correnteza crava
na quina férrea da fraga
uma cunha de ferro; e estrelas,

grãos
de arroz róseos, mães-
d’água tintas, siris que nem lírios
verdes e fungos submarinos
vão deslizando uns sobre os outros.

As
marcas externas
de mau-trato estão todas presentes
neste edifício resistente –
todo resquício material

de a-
-cidente – ausência
de cornija, machadadas, queima e
sulcos de dinamite – teima em
ressaltar; já não é o que era

cova.
Repetida prova
demonstrou que ele pode viver
do que não pode reviver
seu viço. O mar nele envelhece.

Tradução de José Antonio Arantes

The Fish

wade
through black jade.
Of the crow-blue mussel-shells, one keeps
adjusting the ash-heaps;
opening and shutting itself like

an
injured fan.
The barnacles which encrust the side
of the wave, cannot hide
there for the submerged shafts of the


sun,
split like spun
glass, move themselves with spotlight swiftness
into the crevices—
in and out, illuminating

the
turquoise sea
of bodies. The water drives a wedge
of iron through the iron edge
of the cliff; whereupon the stars,

pink
rice-grains, ink-
bespattered jelly fish, crabs like green
lilies, and submarine
toadstools, slide each on the other.

All
external
marks of abuse are present on this
defiant edifice—
all the physical features of

ac-
cident—lack
of cornice, dynamite grooves, burns, and
hatchet strokes, these things stand
out on it; the chasm-side is

dead.
Repeated
evidence has proved that it can live
on what can not revive
its youth. The sea grows old in it.

Marianne Moore

Um Túmulo

Homem olhando o mar,
roubando a vista de quem tem tanto direito à ela quanto você mesmo,
é da natureza humana ficar no meio de alguma coisa,
mas não se pode ficar no meio disto;
o mar não tem nada para dar senão um bem cavado túmulo.
Os abetos repousam em procissão, cada um com a esmeralda de capins em touceira na copa,
reservados como os seus contornos, sem nada dizer;
a repressão, no entanto, não é a mais óbvia característica do mar;
o mar é um colecionador, rápido em devolver um olhar rapace.
Há outros além de você que vestiram esse mesmo olhar –
cuja expressão não é mais um protesto; os peixes não mais os investigam
pois não restaram seus ossos:
os homens baixam as redes, sem saber do fato de que estão profanando um túmulo,
e vão embora remando depressa – as lâminas dos remos
juntas se deslocam como os pés de aranhas d’água, como se a morte fosse algo que não existisse.
As rugas progridem entre si numa falange – belas sob redes de espuma,
e somem sem ar enquanto o mar farfalha nas algas;
as aves nadam pelo ar em máxima velocidade, assobiando como outrora –
o casco da tartaruga flagela os pés dos penhascos, em movimento sob elas;
e o oceano, sob o pulso dos faróis e o ruído dos sinos das boias,
avança como sempre, parecendo não ser aquele mesmo oceano em que as coisas que caem são fadadas a afundar –
em que, se elas se viram e se torcem, é sem volição e tampouco consciência.


Tradução de Adriano Scandolara

Uma Cova

Homem mirando o mar,
tirando a visão daqueles que têm tanto direito a ela quanto você tem,
é da natureza humana ficar no meio das coisas,
mas no meio desta você não pode ficar.
o mar nada tem a dar a não ser uma cova bem cavada.
Os abetos se erguem em procissão, cada qual com um pé de peru esmeralda no alto,
discretos como seus contornos, dizendo nada;
repressão, no entanto, não é a mais óbvia característica do mar;
o mar é um coletor, pronto para devolver um olhar rapace.
Outros fora você ostentaram este olhar –
cuja expressão não é mais um protesto; os peixes não mais o investigam
porque seus ossos não sobreviveram:
os homens lançam redes, inconscientes de que profanam uma cova,
e partem vogando velozes – as pás dos remos
movendo-se juntas que nem patas de aranhas-aquáticas, como se não existisse a morte.
Os franzidos das águas marcham em falange – belos sob as malhas de espuma,
e somem arfando enquanto o mar vai e vem bramindo entre as plantas marinhas;
os pássaros cruzam o ar num zás, soltando guinchos como dantes –
a concha da tartaruga açoita os pés das rochas, em movimento embaixo delas;
e o oceano, sob a pulsação de faróis e ruídos de bóias sonoras,
avança como sempre, como se não fosse o oceano no qual as coisas que caem estão fadadas a afundar –
no qual, se se viram e reviram, é sem vontade e sem consciência.

Tradução de José Antonio Arantes

A Grave

Man looking into the sea,
taking the view from those who have as much right to it as you have to it yourself,
it is human nature to stand in the middle of a thing,
but you cannot stand in the middle of this;
the sea has nothing to give but a well excavated grave.
The firs stand in a procession, each with an emerald turkey-foot at the top,
reserved as their contours, saying nothing;
repression, however, is not the most obvious characteristic of the sea;
the sea is a collector, quick to return a rapacious look.
There are others besides you who have worn that look –
whose expression is no longer a protest; the fish no longer investigate them
for their bones have not lasted:
men lower nets, unconscious of the fact that they are desecrating a grave,
and row quickly away — the blades of the oars
moving together like the feet of water-spiders as if there were no such thing as death.
The wrinkles progress among themselves in a phalanx – beautiful under networks of foam,
and fade breathlessly while the sea rustles in and out of the seaweed;
the birds swim throught the air at top speed, emitting cat-calls as heretofore –
the tortoise-shell scourges about the feet of the cliffs, in motion beneath them;
and the ocean, under the pulsation of lighthouses and noise of bell-buoys,
advances as usual, looking as if it were not that ocean in which dropped things are bound to sink –
in which if they turn and twist, it is neither with volition nor consciousness.


Marianne Moore

Fonte: ver aqui

'' a morte ardente que depois é glacial''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 61

''cavalo cor de pêssego''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 56

 «Durante sete arriscadíssimos anos praticou esse luxo: a coragem.»

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 54

''odiosamente sabidos''

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 54

 «(...), as cerimónias e a ira do homem vermelho, o ar sem nuvens do deserto, a pradaria sem lei, a terra fundamental cuja proximidade apressa o bater dos corações com a proximidade do mar.»

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 53

Daedalus





I

Like the enormous liner of his limbs
and fell.
Remain behind, look on
What’s left of what was once in blighted remains.
That imponderable body
Smote my desire, now smitten
Mortally.
I lift his head, his death dampens
The moist palm of my hand like handled fear
Like fear cramping my hand
and stand.
Remain behind, entertain posthumous fear.

II

Come where no crowds can trouble us divert us
No acrobats hawkers bottles or street musicians
No towering necks like buildings overlook
Intimate revelation.

I take your hand
Spectre
And steadily lead you
Across morning haunted lawns in earlier
Days, and show
With a reversal of our growing older
How it began, what caused, the germ of time.

Where florid in the night pregnant nightdresses
Proceed sedately down unlighted stairs
Like people. And in the garden
Large lake unreal. Hark, I hear visitant
Swans, and the moths in the trees
Like minor caverns humming. There he draws
Antennae from paralyzed spiders, weapons
In his warlock fingers brandished: or runs
Engendering the eventual major strength like engines
Preparant. I cannot discern you in the leaves or in the
Undergrowth, when starting down the steep hills
He flies precipitate: Spectre, Spectre, where
If among these early places lie you, do you lie?

He fell, not then. Recently sure has fallen from that high
Platform. Formed in fearlessness, has fallen
Like through thought’s clouds through fear, as You stood
Waiting with wanting breast to catch, he in his fall
Evaded. Passed towards a grave straight through.
Of Course You Knew, for saw his comet face
Approaching downward like irresistible.
I mourn him. Him I mourn, from morn to morning.

III

Where once he trod
I cannot tread;
From the home he is gone from
I am prohibited:
We cannot be
While he is gone from being;
While he is not with being
I am as well miserably unloving;
Totally bereft I too am totally absent,
Appearing here, although
Bruisable and buriable seeming, am too bruised
In my dead
To buried.
Spectre who spreads
Internal dissension,
Dividing the unit army of the body
To coward forces,
Since I have brought
To these private places
Sick with his not being, with his recalled
Reverberant fleet blooms of doing and coming,
Empty with his going, since accomplished, entertained,
Shown choicest hothouse blossoms, phenomenal
Plants he acted on the air like dances lasting,
Since he is not here but where you know with doom—

IV

Where wander those once known herons
Or rabbits here
With shattered entrapped forepaws pitiable in crimson
Killing have known,
And seven-year-old boys locked among ominous
Shadows, enveloped
Have known, and are
At the unmerciful onrush of determined seas
Gathers small craft
There the acquainted faces of the dead sailors
Sight that sees
Where those once known herons fled in fear, to where I
Like lonely herons
The abandoned heroine

V

Go. With mild gradual descent
Burden the memory
Not as he fell, in anger, in the combat
With forms invisible intactual fought
On that mortal rooftop: not with celestial
Speed brought down, in meritorious
Defeat no beating, but like lamed
Herons or birds in wounded slope
Descending down to lamentable homes
In scraggy caves, borne down by death, I come
Drawn down to earth, and underneath
The earth, like one drawn under
Lethal water by an unknown weight
Unseen invisible, but not unknown is fear.

George Barker

 “My one, my one, my only love, Hide, hide your face in a leaf, And let the hot tear falling burn The stupid heart that will not learn The everywhere of grief.” 

 George Barker




                                                 1913 - 1986/Canadian Elizabeth Smart

Trying To Write

 


Why am I so frightened
To say I'm me
And publicly acknowledge
My small mastery?
Waiting for sixty years
Till the people take out the horses
And draw me to the theatre
With triumphant voices?
I know this won't happen
Until it's too late
And the deed done (or not done)
So I prevaricate, Egging
them on and keeping
Roads open (just in case)
Go on! Go on and do it
In my place!
Giving love to get it
(The only way to behave).
But hated and naked
Could I stand up and say
Fuck off! or, Be my slave!
To be in a very unfeminine
Very unloving state
Is the desperate need
Of anyone trying to write.


Elizabeth Smart
1913-1986

O Poor People


Let us invoke a healthy heart-breaking
Towards the horrible world:
Let us say O poor people
How can they help being so absurd,
Misguided, abused, misled?

With unsifted saving graces jostling about
On a mucky medley of needs,
Like love-lit shit,
Year after cyclic year
The unidentifiable flying god is missed.

Emotions sit in their heads disguised as judges,
Or are twisted to look like mathematical formulae,
And only a scarce god-given scientist notices
His trembling lip melting the heart of the rat.

Whoever gave us the idea somebody loved us?
Far in our wounded depths faint memories cry,
A vision flickers below subliminally
But immanence looms unbearably: TURN IT OFF! they hiss.

Elizabeth Smart
1913-1986

Blake's Sunflower






1

Why did Blake say
'Sunflower weary of time'?
Every time I see them
they seem to say
Now! with a crash
of cymbals!
Very pleased
and positive
and absolutely delighting
in their own round brightness.

2
Sorry, Blake!
Now I see what you mean.
Storms and frost have battered
their bright delight
and though they are still upright
nothing could say dejection
more than their weary
disillusioned
hanging heads.


Elizabeth Smart
1913-1986

“Louder Than Bombs”

 


A mulher da capa de “Louder Than Bombs”


''Shelagh Delaney, nasceu no dia 25 de novembro de 1938 em Salford, Manchester, norte da Inglaterra, escreveu aos 18 anos a peça “A Taste of Honey” (Um Gosto de Mel), que conta a história de uma jovem proletária que engravida de um marinheiro negro, para então encontrar consolo ao lado de um estudante de arte homossexual. A obra foi revolucionária por falar sobre assuntos restritos a época, como racismo e homossexualidade. A peça estreou em Londres quando a autora ainda era adolescente.

Em 1961, a obra foi adaptada para o cinema, também com sucesso, e rendeu o Bafta (equivalente britânico ao Oscar) para Delaney e para o corroteirista Tony Richardson. [A personagem Jo é interpretada no filme pela atriz Rita Tushingham, que aparece na capa do single “Hand in Glove” e do vídeo de “Girlfriend in a Coma”.]
A peça original inspirou as músicas “A Taste of Honey” e “Your Mother Should Know” gravadas pelos Beatles.
Em declarações à NME em 1986, Morrissey disse: “Eu nunca fiz nenhum segredo do fato de que pelo menos 50 por cento da minha razão de escrita pode ser atribuída a Shelagh Delaney.”
Em 1985, fez sucesso com “Dançando com um Estranho”, contando a história de Ruth Ellis, última mulher a ser enforcada na Grã-Bretanha, em 1955.
No mesmo ano, Shelagh foi eleita membro da Royal Society of Literature.
Morrissey usou trechos da sua peça “A Taste of Honey” nas músicas: Hand In Glove, Reel Around The Fountain, This Night Has Opened My Eyes, Shoplifters Of The World Unite e Alma Matters.


Ela também está na capa do single Girlfriend in a coma (1987).''


O ESTADO LARVAR

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 51

O MISTERIOSO, LÓGICO FIM

    A 25 de dezembro de 1920 o corpo de Monk Eastman amanheceu numa das ruas centrais de Nova Iorque. Recebera cinco balas. Desconhecedor feliz da morte, um gato ordinário rondava-o com certa perplexidade.

Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 49

casa de vender pássaros

 « Aos 19 anos, cerca de 1892, abriu com o auxílio do pai uma casa de vender pássaros.»


 Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 43

« (....); combates de rua nos quais o homem se perdia como no mar, porque o calcavam até à morte;»


 Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 43

My heart, my love, my Lord, my only bride



I Have Trembled My Way Deep
Canção de Nick Cave and the Bad Seeds

I have trembled my way deep into surrender
I have stretched my aching body across the world
I have stood at the threshold of your wonder
Bid me enter, Lord, allow me to unfold

Lay your golden head upon my breast
Pierce me deep and usher me inside
Your threshold where I will eternal rest

My heart, my love, my Lord, my only bride
My heart, my love, my Lord, my one true bride
Sanctuary where the eternal yearning rest
Unpetal me and burst me open wide
And lay your shining head upon my breast

Compositores: Nicholas Cave / Warren Ellis

 « A viúva examinou com ansiedade esses meteoros regulares e leu neles a lenta e confusa fábula de um dragão, que sempre protegera uma raposa, apesar das suas longas ingratidões e constantes delitos.»


 Jorge Luis Borges. História Universal da Infâmia. Tradução José Bento. Quetzal Editores. 1ª Edição, 2015. P. 40/1

gatekeeping

''Os americanos também inventaram um termo para isso: gatekeeping, um tecto de vidro cultural em que o acesso ao controlo sobre ideias, tópicos de discussão e produtos é limitado a um grupo dominante que decide quem tem acesso ou direito a uma comunidade ou identidade. Essencialmente, ao estabelecer uma hierarquia de poder, o gatekeeping consolida-se como uma prática contínua de exclusão.''