quarta-feira, 30 de março de 2022
«(...) escondidos na penumbra das árvores»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 158
terça-feira, 29 de março de 2022
«(...), arruíno tudo com a minha tristeza.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 138
« - O governo é muito abusador.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 131
«(...), entreviu, como uma solução que valeria a pena não descartar, a sua própria mão, dotada de um revólver imaginário, que apontava à têmpora.»
finca-pé
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 115
«(...), no medo e na dor da morte.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 113
''fumava ensimesmado''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 113
« - É horrível. Há cada vez mais gente, embora já não sobre espaço. Lutam todos, uns contra os outros. Não estaremos nas vésperas de uma grande hecatombe?»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 111
« - Já não há lugar para indivíduos - assegurou fleumaticamente Arévalo. - Só há muitos animais, que nascem, se reproduzem e morrem. A consciência é a característica de alguns, como as asas ou os cornos são a de outros.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 111
« - A nossa passividade peca por indignidade.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 108
domingo, 27 de março de 2022
''misérias pessoais''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 101
'' Não me acobardei.''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 98
''explicações dogmáticas''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 82
« Esta não é uma época para gente adormecida.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 80
« - Parece um disfarce alugado. Sobra tecido.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 78
sábado, 26 de março de 2022
« Chulo de meninas pobres.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 72
''Para cada idade há um encanto.''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 69
« - Estive a pensar.
- Em que é que pensaste?
-Estupidezes. Que estamos velhos. Que não há lugar para os velhos porque nada está previsto para eles. Para nós. Olha que novidade.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 68F.M.I.
Mais um pedaço da minha vida
Um pedaço um pouco especial
Trata-se de um texto que foi escrito
Assim, de um só jorro
Numa noite de Fevereiro de 79
E que talvez tenha um ou outro pormenor
Que já não é muito actual
Eu vou-vos dar o texto tal e qual como eu o escrevi nessa altura
Sem ter modificado nada
Por isso vos peço que não se deixem distrair por esses pormenores
Que possam ser já não muito actuais
E que isso não contribua para desviar a vossa atenção
Do que me parece ser o essencial neste texto
Chama-se FMI
Quer dizer, Fundo Monetário Internacional
Não sei porque é que se riem
É uma organização democrática dos países todos
Que se reúnem, como as pessoas
Em torno de uma mesa para discutir os seus assuntos
E no fim tomar as decisões que interessam a todos
É o internacionalismo monetário
Mais novidade do que lagostim
Nariz que reconhece o cheiro do pilim
Distingue bem o Mortimor do Meirim
A produtividade, ora aí está, quer dizer
Há tanto nesta terra que ainda está por fazer
Entrar por aí a dentro, analisar, e então
Do meu 'attaché-case' sai a solução!
FMI O bombástico de plástico para si
FMI Não há força que retorça o FMI
Eis a imagem 'on the rocks' do cancro do tabaco
Enfio uma gravata em cada fato-macaco
E meto o pessoal todo no mesmo saco
A produtividade, ora aí está, quer dizer
Não ando aqui a brincar, não há tempo a perder
Batendo o pé na casa, espanador na mão
É só desinfectar em superprodução!
FMI O heróico paranóico hara-kiri
FMI Panegírico, pro-lírico daqui
Palavras para si e palavras para dó
A contas com o nada que swingar o sol-e-dó
Depois a criadagem lava o pé e limpa o pó
A produtividade, ora nem mais, célulazinhas cinzentas
Sempre atentas
E levas pela tromba se não te pões a pau
Num encontrão imediato do 3º grau
FMI Não há ronha que envergonhe o FMI
FMI
Não desfolhes em vão este malmequer que bem-te-quer
Mal-te-quer, vem-te-quer, ovomalt'e-quer
Messe gigantesca, vem-te vindo, VIM na cozinha, VIM na casa-de-banho
VIM no Politeama, VIM no Águia D'ouro, VIM em toda a parte, vem-te filho
Vem-te comer ao olho, vem-te comer à mão
Olha os pombinhos pneumáticos que te arrulham por esses cartazes fora
Olha a Música no Coração da Indira Gandi
Olha o Moshe Dayan que te traz debaixo d'olho
O respeitinho é muito lindo e nós somos um povo de respeito, né filho?
Nós somos um povo de respeitinho muito lindo
Saímos à rua de cravo na mão sem dar conta de que saímos à rua de cravo na mão a horas certas, né filho?
Consolida filho, consolida, enfia-te a horas certas no casarão da Gabriela que o malmequer vai-te tratando do serviço nacional de saúde
Consolida filho, consolida, que o trabalhinho é muito lindo
O teu trabalhinho é muito lindo, é o mais lindo de todos
Como o Astro, não é filho?
O cabrão do Astro entra-te pela porta das traseiras, tu tens um gozo do caraças, vais dormir entretido, não é?
Pois claro, ganhar forças, ganhar forças para consolidar
Para ver se a gente consegue num grande esforço nacional estabilizar esta destabilização filha-da-puta, não é filho?
Pois claro!
Estás aí a olhar para mim
Estás a ver-me dar 33 voltinhas por minuto
Pagaste o teu bilhete, pagaste o teu imposto de transação e estás a pensar lá com os teus zodíacos:
Este tipo está-me a gozar, este gajo quem é que julga que é?
Né filho? Pois não é verdade que tu és um herói desde de nascente?
A ti não é qualquer totobola que te enfia o barrete, meu grande safadote!
Meu Fernão Mendes Pinto de merda, né filho?
Onde está o teu Extremo Oriente, filho?
A-ni-ki-bé-bé, a-ni-ki-bó-bó
Tu és Sepúlveda, tu és Adamastor, pois claro
Tu sozinho consegues enrabar as Nações Unidas com passaporte de coelho, não é filho?
Mal eles sabem, pois é, tu sabes o que é gozar a vida!
Entretém-te filho, entretém-te!
Deixa-te de políticas que a tua política é o trabalho, trabalhinho, porreirinho da Silva,
E salve-se quem puder que a vida é curta e os santos não ajudam quem anda para aqui a encher pneus com este paleio de Sanzala em ritmo de pop-chula, não é filho?
A one, a two, a one two three
FMI
Come on baby a ver se me comes!
'Camóne' Luís Vaz, amanda-lhe com os decassílabos que eles já vão saber o que é meterem-se com uma nação de poetas!
E zás, enfio-te o Manuel Alegre no Mário Soares
Zás, enfio-te o Ary dos Santos no Álvaro de Cunhal
Zás, enfio-te a Natalia Correia no Sá Carneiro
Zás, enfio-te o Zé Fanha no Acácio Barreiros
Zás, enfio-te o Pedro Homem de Melo no Parque Mayer
E acabamos todos numa sardinhada ao integralismo Lusitano
A estender o braço
Meio Rolão Preto, meio Steve McQueen
Ok boss, tudo ok
Estamos numa porreira meu
Um tripe fenomenal
Proibido voltar atrás
Viva a liberdade, né filho?
Pois, o irreversível, pois claro, o irreversívelzinho
Pluralismo a dar com um pau, nada será como dantes
Agora todos se chateiam de outra maneira, né filho?
Ora que porra, deixa lá correr o marfil, homem, andas numa alta, pá, é assim mesmo
Cada um a curtir a sua, podia ser tão porreiro, não é?
Preocupações, crises políticas pá?
A culpa é dos partidos pá!
Esta merda dos partidos é que divide a malta pá
Pois pá, é só paleio pá
O pessoal na quer é trabalhar pá!
Razão tem o Jaime Neves pá!
Olha deixaste cair as chaves do carro!
Pois pá!
Que é essa orelha de preto que tens no porta-chaves?
É pá, deixa-te disso, não destabilizes pá!
Eh, faz favor, mais uma bica e um pastel de nata
Uma porra pá, um autentico desastre o 25 de Abril
Esta confusão pá, a malta estava sossegadinha
A bica a 15 tostões, a gasosa a sete e coroa
Tá bem, essa merda da pide pá, Tarrafais e o carágo
Mas no fim de contas quem é que não colaborava, ah?
Quantos bufos é que não havia nesta merda deste país, ah?
Quem é que não se calava, quem é que arriscava coiro e cabelo, assim mesmo, o que se chama arriscar, ah?
Meia dúzia de líricos, pá, meia dúzia de líricos que acabavam todos a fugir para o estrangeiro, pá
Isto é tudo a mesma carneirada!
Oh sr. guarda venha cá, á
Venha ver o que isto é, é
O barulho que vai aqui, i
O neto a bater na avó, ó
Deu-lhe um pontapé no cu, né filho?
Tu vais conversando, conversando
Que ao menos agora pode-se falar
Ou já não se pode?
Ou já começaste a fazer a tua revisãozinha constitucional tamanho familiar, ah?
Estás desiludido com as promessas de Abril, né?
As conquistas de Abril!
Eram só paleio a partir do momento que tas começaram a tirar e tu ficaste quietinho, né filho?
E tu fizeste como o avestruz
Enfiaste a cabeça na areia
Não é nada comigo, não é nada comigo, né?
E os da frente que se lixem
E é por isso que a tua solução é não ver
é não ouvir, é não querer ver, é não querer entender nada
Precisas de paz de consciência
Não andas aqui a brincar, né filho?
Precisas de ter razão
Precisas de atirar as culpas para cima de alguém
E atiras as culpas para os da frente
Para os do 25 de Abril
Para os do 28 de Setembro
Para os do 11 de Março
Para os do 25 de Novembro
Para os do... que dia é hoje, ah?
FMI
Todos temos culpas no cartório
Foi isso que te ensinaram
Não é verdade?
Esta merda não anda
Porque a malta, pá
A malta não quer que esta merda ande
Tenho dito
A culpa é de todos
A culpa não é de ninguém
Não é isto verdade?
Quer-se dizer
Há culpa de todos em geral e não há culpa de ninguém em particular! Somos todos muita bons no fundo, né?
Somos todos uma nação de pecadores e de vendidos, né?
Somos todos, ou anti-comunistas ou anti-faxistas
Estas coisas até já nem querem dizer nada
Ismos para aqui
Ismos para acolá
As palavras é só bolinhas de sabão
Parole parole parole e o Zé é que se lixa
Cá o pintas é sempre o mexilhão
Eu quero lá saber deste paleio vou mas é ao futebol
Pronto
Viva o Porto, viva o Benfica! Lourosa! Lourosa! Marrazes! Marrazes!
Fora o arbitro, gatuno! Qual gatuno, qual caralho!
Razão tinha o Tonico de Bastos para se entreter, né filho?
Entretém-te filho, com as tuas viúvas e as tuas órfãs
Que o teu delegado sindical vai tratando da saúde aos administradores
Entretém-te, que o ministro do trabalho trata da saúde aos delegados sindicais
Entretém-te filho, que a oposição parlamentar trata da saúde ao ministro do trabalho
Entretém-te, que o Eanes trata da saúde à oposição parlamentar
Entretém-te, que o FMI trata da saúde ao Eanes
Entretém-te filho e vai para a cama descansado que há milhares de gajos inteligentes a pensar em tudo neste mesmo instante
Enquanto tu adormeces a não pensar em nada
Milhares e milhares de tipos inteligentes e poderosos com computadores, redes de policia secreta
Telefones, carros de assalto, exércitos inteiros, congressos universitários, eu sei lá!
Podes estar descansado que o Teng Hsiao-ping está a tratar de ti com o Jimmy Carter
O Brezhnev está a tratar de ti com o João Paulo II
Tudo corre bem, a ver quem se vai abotoar com os 25 tostões de riqueza que tu vais produzir amanhã nas tuas oito horas
A ver quem vai ser capaz de convencer de que a culpa é tua e só tua se o teu salário perde valor todos os dias
Ou de te convencer de que a culpa é só tua se o teu poder de compra é como o rio de S. Pedro de Moel
Que se some nas areias em plena praia
Ali a 10 metros do mar em maré cheia e nunca consegue desaguar de maneira que se possa dizer: porra, finalmente o rio desaguou!
Vão te convencer de que a culpa é tua e tu sem culpa nenhuma, tens tu a ver, tens tu a ver com isso, não é filho?
Cada um que se vá safando como puder, é mesmo assim, não é?
Tu fazes como os outros, fazes o que tens a fazer
Votas à esquerda moderada nas sindicais
Votas no centro moderado nas deputais
E votas na direita moderada nas presidenciais!
Que mais querem eles, que lhe ofereças a Europa no natal?!
Era o que faltava!
É assim mesmo, julgam que te levam de mercedes, ora toma
Para safado, safado e meio, né filho?
Nem para a frente nem para trás
E eles que tratem do resto, os gatunos, que são pagos para isso, né?
Claro! Que se lixem as alternativas, para trabalho já me chega
Entretém-te meu anjinho, entretém-te
Que eles são inteligentes, eles ajudam, eles emprestam, eles decidem por ti, decidem tudo por ti
Se hás-de construir barcos para a Polónia ou cabeças de alfinete para a Suécia
Se hás-de plantar tomate para o Canada ou eucaliptos para o Japão, descansa que eles tratam disso
Se hás-de comer bacalhau só nos anos bissextos
Ou hás-de beber vinho sintético de Alguidares-de-Baixo!
Descansa, não penses em mais nada
Que até neste país de pelintras se acho normal
Haver mãos desempregadas
E se acha inevitável haver terras por cultivar!
Descontrai baby, come on descontrai
Afinfa-lhe o Bruce Lee
Afinfa-lhe a macrobiótica
O biorritmo, o hoscópio
Dois ou três ovniologistas
Um gigante da ilha de Páscoa
E uma Grace do Mónaco de vez em quando para dar as boas festas às criancinhas!
Piramiza filho, piramiza
Antes que os chatos fujam todos para o Egipto
Que assim é que tu te fazes um homenzinho
E até já pagas multa se não fores ao recenseamento
Pois pá, isto é um país de analfabetos, pá!
Dá-lhe no Travolta
Dá-lhe no disco-sound
Dá-lhe no pop-chula
Pop-chula pop-chula
Iehh iehh
J. Pimenta forever!
Quanto menos souberes a quantas andas melhor para ti
Não te chega para o bife?
Antes no talho do que na farmácia
Não te chega para a farmácia?
Antes na farmácia do que no tribunal
Não te chega para o tribunal?
Antes a multa do que a morte
Não te chega para o cangalheiro?
Antes para a cova do que para não sei quem que há-de vir
Cabrões de vindouros, ah?
Sempre a merda do futuro, a merda do futuro
E eu ah? Que é que eu ando aqui a fazer?
Digam lá, e eu?
José Mário Branco, 37 anos
Isto é que é uma porra
Anda aqui um gajo cheio de boas intenções
A pregar aos peixinhos
A arriscar o pêlo, e depois?
É só porrada e mal viver é?
O menino é mal criado, o menino é 'pequeno burguês'
O menino pertence a uma classe sem futuro histórico
Eu sou parvo ou quê?
Quero ser feliz porra
Quero ser feliz agora
Que se foda o futuro
Que se foda o progresso
Mais vale só do que mal acompanhado
Vá mandem-me lavar as mãos antes de ir para a mesa
Filhos da puta de progressistas do caralho da revolução que vos foda a todos!
Deixem-me em paz porra, deixem-me em paz e sossego
Não me emprenhem mais pelos ouvidos caralho
Não há paciência
Não há paciência
Deixem-me em paz caralho
Saiam daqui
Deixem-me sozinho, só um minuto
Vão vender jornais e governos e greves e sindicatos e polícias e generais para o raio que vos parta!
Deixem-me sozinho
Filhos da puta
Deixem só um bocadinho
Deixem-me só para sempre
Tratem da vossa vida que eu trato da minha
Pronto, já chega
Sossego porra
Silêncio porra
Deixem-me só, deixem-me só, deixem-me só
Deixem-me morrer descansado
Eu quero lá saber do Artur Agostinho e do Humberto Delgado
Eu quero lá saber do Benfica e do bispo do Porto
Eu quero se lixe o 13 de Maio e o 5 de Outubro
E o Melo Antunes e a rainha de Inglaterra e o Santiago Carrilho e a Vera Lagoa
Deixem-me só porra, rua, larguem-me
Desopila o fígado, arreda, T'arrenego Satanás, filhos da puta
Eu quero morrer sozinho ouviram?
Eu quero morrer
Eu quero que se foda o FMI
Eu quero lá saber do FMI
Eu quero que o FMI se foda
Eu quero lá saber que o FMI me foda a mim
Eu vou mas é votar no Pinheiro de Azevedo se eu tornar a ir para o hospital, pronto
Bardamerda o FMI, o FMI é só um pretexto vosso seus cabrões
O FMI não existe
O FMI nunca aterrou na Portela coisa nenhuma
O FMI é uma finta vossa para virem para aqui com esse paleio
Rua, desandem daqui para fora
A culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa, a culpa é vossa
Oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe, oh mãe
Mãe, não quero pensar mais
Mãe, eu quero morrer mãe
Eu quero desnascer
Ir-me embora
Sem sequer ter que me ir embora
Mãe, por favor
Tudo menos a casa em vez de mim
Outro maldito que não sou senão este tempo que decorre entre fugir de me encontrar
E de me encontrar fugindo
De quê mãe?
Diz, são coisas que se me perguntem?
Não pode haver razão para tanto sofrimento
E se inventássemos partir, para regressar
A partir e aí nessa viagem
Ressuscitar da morte às arrecuas que me deste
Partida para ganhar
Partida de acordar
Abrir os olhos
Numa ânsia colectiva de tudo fecundar
Terra, mar, mãe
Lembrar como o mar nos ensinava a sonhar alto
Lembrar nota a nota o canto das sereias
Lembrar o depois do adeus
E o frágil e ingénuo cravo da Rua do Arsenal
Lembrar cada lágrima
Cada abraço
Cada morte
Cada traição
Partir aqui com a ciência toda do passado, partir, aqui, para ficar
Como entrevi um dia
A chorar de alegria
De esperança precoce e intranquila
O azul dos operários da Lisnave a desfilar
Gritando ódio apenas ao vazio
Exército de amor e capacetes
Assim mesmo na Praça de Londres o soldado lhes falou
Olá camaradas, somos trabalhadores
Eles não conseguiram fazer-nos esquecer
Aqui está a minha arma para vos servir
Assim mesmo, por detrás das colinas onde o verde está à espera se levantam antiquíssimos rumores
As festas e os suores
Os bombos de Lavacolhos
Assim mesmo senti um dia
A chorar de alegria, de esperança precoce e intranquila
O bater inexorável dos corações produtores, os tambores
É nosso!
Mar antigo a que regresso
Neste cais está arrimado o barco sonho em que voltei
Neste cais eu encontrei a margem do outro lado, Grandola Vila Morena
Diz lá, valeu a pena a travessia?
Valeu pois
No fundo deste mar, encontrareis tesouros recuperados
De mim que estou a chegar do lado de lá para ir convosco
Tesouros infindáveis que vos trago de longe e que são vossos
O meu canto e a palavra
O meu sonho é a luz que vem do fim do mundo
Dos vossos antepassados que ainda não nasceram
A minha arte é estar aqui convosco
E ser-vos alimento e companhia na viagem para estar aqui de vez
Sou português, pequeno burguês de origem
Filho de professores primários
Aprendiz de feiticeiro, faltam-me dentes
Sou o Zé Mário Branco, 37 anos, do Porto
Muito mais vivo que morto
Contai com isto de mim para cantar e para o resto
Por dentro da distância percorrida
Fazer de cada perda uma raiz
E improvavelmente ser feliz
De como aqui chegar não é misterio contar
O que já sabe quem souber
O estrume em que germina a ilusão
Fecundará, por certo, esta canção
Que depois dela só o tempo é forte
E a morte nunca o tempo arredime
Mas sim, o amor dos homens que se exprime
Já que a moral da história é tão pequena
Que nunca por vingança eu vos daria
No ventre das canções, sabedoria
quinta-feira, 24 de março de 2022
'' conta-se o pecado, não o pecador''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 66
« Como um animal que anseia pela sua toca, tinha vontade de voltar para casa, mas descobriu, com assombro, que estava inquieto e optou por cansar um pouco os nervos, antes de se fechar no quarto para passar a noite.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 55sexta-feira, 18 de março de 2022
«(...), tentou descortinar, sem pressa, a dor.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 54
«(...) a simples ideia do amor humaniza.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 52
« - Tu não tens alma - disse Rey, como se o desconsiderasse. - Porque é que o governo tolera que aquele charlatão difunda a peçonha através da rádio oficial?»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 49«A vida do tímido é difícil.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 33
«Em contrapartida, esperava a noite com temor, porque, poucas horas depois, acordava - um mau hábito - e perdia fatalmente o sono com pensamentos tristes.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 28domingo, 13 de março de 2022
sábado, 12 de março de 2022
« Estava um dia tão destemperado que o cobertor e o poncho sobre a cama eram insuficientes. Recorreu ao sobretudo. Pensou que estava a passar por uma época de neurastenias inopinadas, já que a visão da sua cama, semicoberta pelo sobretudo castanho, com manchas e peladas, o deprimia.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 27« Vidal pensou que manter a honestidade na pobreza era mais difícil do que as pessoas julgavam e acrescentou: Hoje, mais do que ontem, e com muito menos brilho.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 24« As pessoas afirmam que muitas explicações convencem menos do que uma verdade só, mas a verdade é que há mais de uma razão para quase tudo. Dir-se-ia que se encontram sempre vantagens para prescindir da verdade.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 23«Porque, ultimamente, se afeiçoara à fidelidade: era fiel aos amigos, aos lugares, a cada um dos seus fornecedores e ao seu local de venda, aos horários, aos costumes.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 23«Com os anos, a sua timidez aumentara inexplicavelmente; era como se não acreditasse em si, e estava sempre a retirar-se, não fosse dar-se o caso.»
sexta-feira, 11 de março de 2022
quinta-feira, 10 de março de 2022
«Quando os pássaros cantaram e nas fendas apareceu a luz da manhã, ficou deveras entristecido, porque tinha perdido a noite. Nesse momento, adormeceu.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 17« Disse a si próprio que, no dia seguinte, estaria muito cansado e apressou o regresso ao quarto. Já na cama, formulou com relativa lucidez (péssimo sintoma para o acordado) : Cheguei a uma altura da vida em que o cansaço não serve para dormir e o sono não serve para descansar.»
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 16
''ela parecia uma rapariga decente''
Adolfo Bioy Casares. Diário da Guerra aos Porcos. Tradução do castelhano (argentino) Sofia Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu. Cavalo de Ferro., p. 14