ao acaso encontrei-me encostado a uma esquina
olhar vazio varrendo a multidão, parei
sorri e tu vieste, fomos andando
os ombros tocavam-se, em direcção a casa
pediste-me para tomar um duche, eu deitei-me
ouvi o barulho da água resvalando pelo teu corpo sujo de
cidade e de engates
sujo pelos dias e noites e mais dias que não te tive
esperei-te deitado, outro cigarro
e ainda espero...
...gosto dos corpos que riem, frescos
rasgam-se à ternura nocturna dos dedos, e ao desejo
húmido da boca, que sempre percorre e descobre...
tacteio-te de alto a baixo
reconhecendo-te num gemido que também me pertence, no
escuro
contaste-me uma improvável aventura de tarzan, ouvia-te
e no silêncio do quarto fulguravam aves que só eu via...
...sorri ao enumerar os restos que a manhã encontraria
pelo chão
manchas de esperma, ténis esburacados, calças sujíssimas,
blusão cheio de auto-colantes, peúgas encortiçadas pelo suor
as cuecas rotas, sujas de merda...
e tuas mãos, recordo-me
sobretudo de tuas mãos imensas sobre as coxas
teu corpo nu, à beira da cama, em sossegado sono...
Al Berto. Trabalhos do Olhar. Contexto Editora, p. 32
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