segunda-feira, 8 de agosto de 2016
[Sobre Natália Correia, Jorge de Sena disse: "um poeta que se impôs pessoalmente e às suas atitudes, na vida literária portuguesa […] pela forma como soube transformar o escândalo numa espécie de terror sagrado do provincianismo embevecido". Esse pecado original acompanhou-a até ao fim. A independência tem um alto preço (...). Em vida, Natália foi respeitada e ridicularizada com igual convicção. Depois da sua morte, lembro-me das palavras solidárias de David Mourão-Ferreira e Manuel Alegre, enaltecendo no Parlamento a memória da "feiticeira cotovia". De resto, a generalidade dos companheiros de geração olhou para o lado, numa reserva que traduz o preconceito da intelligentsia contra a autora de Mátria. (…)
Poeta, ensaísta, dramaturga, ficcionista, estudiosa de cantares galego-portugueses, da tradição erótica e satírica, do barroco, do surrealismo, de certas vertentes do oculto, e de outros assinalados domínios (...), Natália foi uma vítima do obscurantismo soez dos ominosos tempos da ditadura, mas, ironia suprema, a democracia foi-lhe fatal.
Eduardo Pitta, "Entre o perfume e a morte”, in Comenda de Fogo, Ed. Círculo de Leitores, 2001
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