Nada à minha volta
Nem a sombra de uma casa nem a folha de uma árvore
Ali em cima leio em letras brancas sobre esmalte azul:
GABINETE DO DIRECTOR.
E há um telefone
Gosto dos telefones, dão a ilusão de companhia
É um cepo negro por onde a vida pode entrar.
Gabinete do director.
Lá dentro com ele está alguém e eu vou depois.
Sinto-me vazia como uma flor se deve sentir numa jarra
[com muita água
Que um pintor sem talento vai pintar.
Natureza morta sem frutos.
A solidão de ser recebida por um director.
Mais uma solidão - a hierarquia.
Matilde Rosa Araújo. Voz Nua. Livros Horizonte, Lisboa, 1986., p. 37
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