quinta-feira, 6 de agosto de 2015

MESMO NADA

Nada à minha volta
Nem a sombra de uma casa nem a folha de uma árvore
Ali em cima leio em letras brancas  sobre esmalte azul:
                                                 GABINETE DO DIRECTOR.

E há um telefone
Gosto dos telefones, dão a ilusão de companhia
É um cepo negro por onde a vida pode entrar.
Gabinete do director.
Lá dentro com ele está alguém e eu vou depois.
Sinto-me vazia como uma flor se deve sentir numa jarra
                                                                                         [com muita água

Que um pintor sem talento vai pintar.
Natureza morta sem frutos.
A solidão de ser recebida por um director.
Mais uma solidão - a hierarquia.


Matilde Rosa AraújoVoz Nua. Livros Horizonte, Lisboa, 1986., p. 37

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