sábado, 4 de abril de 2015

COMO EU COSTUMAVA DIZER
"Como eu costumava dizer
o amor é mais difícil de nascer nos mais idosos
porque já percorreram
os mesmo velhos trilhos muitas vezes
e depois quando a manhosa agulha se apresenta
não tomam o desvio
e devoram a velha via errada enquanto
o alegre tandem segue em voo
e o maquinista da locomotiva a vapor não reconhece
as novas buzinas eléctricas
e os velhos correm sob o impulso ferrugento
cujo fim se encontra
na erva morta onde
as latas ferrugentas e as molas de colchão e as lâminas de barbear usadas jazem
e a via acaba abruptamente
ali mesmo
embora as chulipas de madeira continuem por uns metros
e os velhos
dizem para si próprios
Bem
Deve ser este sítio
onde temos de nos deitar
E deitam-se mesmo
enquanto a bela carruagem iluminada prossegue lá ao longe
no alto
no cimo da colina
com as janelas cheias de céu azul
e namorados
com flores
e longos cabelos ondulantes
e todos a rirem-se
e a dizerem adeus e
a perguntarem-se a si próprios o que aquele cemitério
onde a via acaba
é"
-"Como Eu Costumava Dizer"
- Lawrence Ferlinghetti
- D Quixote, 1972