«Certas manhãs ficava acordado olhando o rectângulo insidioso, recusando-me a admitir que o dia nascera, temendo a evidência da solidão. O mundo morava longe, muito para lá da porta. Vinha-me dele um frémito longínquo. Agora, porém, o vidro fosco já não me encharca dessa espécie de despertar pavoroso e lívido. Agora sei que o amor nos faz aproximar das coisas, habitá-las, que pelo amor as reconhecemos e que, depois de recebermos a revelação, nada mais é preciso para nos sentirmos vivos.
Como foi possível escrever eu isto? Tenho os membros espessos da insónia. É a fadiga que nos amolece.»
Fernando Namora. Domingo à Tarde. Editora Arcádia. 4ª Edição. p. 18