domingo, 24 de novembro de 2013

«As mulheres não me poderão levar a mal que lhes atribua a loucura, a mim, que também sou, além de mulher, a própria Loucura. Vendo bem as coisas, é o dom da loucura que lhes permite serem, em muitos aspectos, mais felizes do que os homens. Têm sobre eles, em primeiro lugar, a vantagem da beleza, que põem, com razão, acima de tudo e que lhes serve para tiranizar os próprios tiranos. O homem tem as formas rudes, a pele rugosa, a barba selvagem, que o envelhece, e que, ao mesmo tempo, é sinal de sabedoria; as mulheres, com a face macia, a voz doce, a pele lisa, têm a favor os atributos da juventude eterna. Por isso, que procurarão elas na vida, senão agradar aos homens o mais possível? Não será essa a razão de tantos vestidos, pinturas, banhos, penteados, pomadas e perfumes, de toda a arte de brincar ou disfarçar o rosto, os olhos e a pele? E não será a Loucura que melhor lhes entrega os homens? Eles prometem-lhes tudo, e em troca de quê? De prazer. Mas elas só o conseguem graças à Loucura. Isto é evidente, se pensarmos em todas as parvoíces que um homem diz, nas loucuras que pratica, quando procura beneficiar das graças de uma mulher.
   Sabeis agora qual é o primeiro e o principal prazer da vida, e qual a sua origem.»




Erasmo. O Elogio da Loucura. Tradução, prefácio e notas de Maria Isabel Gonçalves Tomás. Livros de bolso Europa-América., p. 37