segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O RUGIDO DO MAR E A ESCURIDÃO

 
Ele pediu ao seu fantasma uma visão do mar,
Que pudesse ancorá-lo no meio do pensamento
Para sempre, para que ele pudesse resignar~se
E não fosse perseguido eternamente;
O fantasma inclinou a cabeça e disse gravemente:
Ó Desolado, ó Esquecido, devias abandonar a tua única dor, e saber
Que edificaste as tuas lágrimas, que fechaste em terra o teu coração;
Devias implorar o rugido do vento e do mar,
E a escuridão, e, tenhamos razão ou não,
Deves pedir sempre o seu desassossego e a sua monotonia;
A sua bruma sobre o teu peito - O seu barco no porto
Carregando as doces madeiras amontoadas no cais.
Ele olhou-a longamente, e depois, com uma gargalhada,
Saltou para o bordo e nunca mais ninguém o viu.
 
 
 
Malcolm Lowry. As cantinas e outros poemas do álcool e do mar. Selecção e Tradução José Agostinho Baptista. Assírio &Alvim, Lisboa, 2008., p.61