segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

XVI

    «CEDO acordei as volúpias
cedo acendi o meu choupo-branco
    de mão na frente dirigi-me ao mar
e aí o erigi sozinho:
    Sopraste e cercaram-me as procelas
uma a uma tiraste-me as aves -
    Meu Deus chamaste-me e como fugir-te?
Fitei no futuro os meses e os anos
    que hão-de regressar sem mim
e mordi-me tão fundo
    que senti o meu sangue devagar a pulsar para o alto
e a gotejar do meu futuro.
   Escavei a terra no momento em que era o culpado
e a tremer ergui a vítima na minha mão
   e falei-lhe tão suavemente
que devagar os seus olhos se abriram e verteram orvalho
   sobre o chão onde eu era culpado.
Derramei o negrume no leito do amor
    com as coisas do mundo nuas no meu espírito
e o meu esperma lancei tão longe
    que devagar as mulheres regressaram ao sol e sofreram
e voltaram a parir as coisas visíveis.
    Meu Deus chamaste-me e como fugir-te?
 Cedo  acordei as volúpias
     cedo acendi o meu choupo-branco
de mão na frente dirigi-me ao mar
    e aí o erigi sozinho:
Sopraste e as minhas entranhas estremeceram
    uma a uma voltaram-me as aves!»





Odysséas Elytis. Louvada Seja (Áxion Estí). Tradução e posfácio Manuel Resende. Assírio&Alvim, 2004., p. 82/3

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