sexta-feira, 10 de junho de 2011

NA MORTE DE CRISTO, CONTRA A NATUREZA DO CORAÇÃO DO HOMEM

      Porque derrama noite o sentimento
por todo o cerco desta chama pura,
e amortecido o sol em sombra escura
dá lágrimas ao fogo e voz ao vento;
       porque da morte o negro encerramento
descobre com tremor a sepultura,
e o monte, que separa da planura
o mar vizinho, divide-se atento,
      de pedra é, homem duro, de diamante
teu coração, pois morte tão severa
não afoga com pranto teu semblante.
      Mas de pedra não é. Sendo-o, qual cera,
de compaixão por ver a Deus amante,
ao rolar entre as pedras se rompera.



Francisco Quevedo. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento, Assírio & Alvim, Lisboa, 1987, p.75

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