domingo, 1 de maio de 2011

«(...) A carne desapareceu das suas pernas e do rosto. Sonhos ardentes tremeluziam nos seus olhos enormes, nos seus dedos secos as unhas tornaram-se compridas e no seu queixo cresceu uma barba áspera e hisurta. O seu olhar era gelado, quando observava as mulheres; a sua boca enchia-se de desdém, quando atravessava uma cidade cheia de pessoas bem vestidas. Via mercadores a negociar, príncipes a caminho das caçadas, pessoas enlutadas chorando os seus mortos, prostitutas que se ofereciam a ele, médicos ocupados com os seus doentes, sacerdotes a determinarem o dia para as sementeiras, amantes a amarem, mães a embalarem os seus filhos - e tudo isto valia a seus olhos, tudo mentia, tudo cheirava mal, tudo cheirava a mentiras, tudo fingia sentido e sorte e beleza, tudo era uma oculta podridão. O mundo tinha um sabor amargo. A vida era sofrimento.»



Hermann Hesse.Siddhartha Um poema Indiano. Tradução de Pedro Miguel Dias. Casa das Letras. 1ª Edição, 1998, p. 21/2

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