As boas graças do presente
não fazem esquecer os anos do passado.
Os olhos cheios de lágrimas,
jamais disse uma palavra ao príncipe de Chu.
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Este jueju, apenas vinte caracteres, necessita, ao bom modo dos comentado-
res chineses, de uma longa explicação.
Terá sido composto em circunstâncias muito particulares, por ordem do príncipe
Ning, irmão do imperador Xuanzong.
O príncipe, apesar de possuir já dez mulheres no seu serralho, cobiçou a esposa
bonita de um pasteleiro da cidade e acabou por fazer dela sua concubina, recom-
pensando o homem com umas tantas moedas de prata. Um ano mais tarde,
perguntou à agora sua concubina favorita se ela ainda recordava o antigo marido.
Como sempre, a mulher não falou e o príncipe deu ordens para trazerem o padei-
ro à presença de ambos. A concubina, ao olhar o marido, começou a chorar.
O príncipe Ning pediu então aos poetas presentes na corte que compusessem
um poema sobre o sucedido. Wang Wei tinha 20 anos e improvisou este jueju.
No entanto, ao referir o príncipe de Chu, recordava uma outra história.
Em 680 a.c., o príncipe de Chu derrotou o príncipe de Xi e ficou com a esposa
deste último. A mulher deu-lhe dois filhos, mas jamais pronunciou uma só palavra
na presença do novo senhor. Um dia explicou porquê: ' Eu, pobre de mim, fui
condenada a servir dois amos. Incapaz de encontrar a morte, que posso então
dizer?''
Com este poema, ao recordar uma história esquecida, Wang Wei impressionou
de tal modo o príncipe Ning, e a corte, que a mulher do pasteleiro foi entregue
ao seu primeiro marido.
Clássicos Chineses. Poemas de Wang Wei. Tradução, prefácio e notas de António Graça de Abreu. Instituto Cultural de Macau, 1993, p. 48
Que bonito ! Obrigado por partilhares ( lembrou me «Os contos Orientais» da Marguerite Yourcenar )
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