terça-feira, 6 de abril de 2010

«O eco subia às árvores...por cima dos edifícios...até às sombras, aos cenários enormes que tinham levantado a toda a volta...contra o céu...ali pretíssimos, ruidosos, inchados que sei cá, monstros de murmúrio imenso...era os medos que saem das folhas...da noite quando ela se mexe...
-Sim, messargento...
Que húmido eu estava no capote, coisa realmente horrível para a minha estreia militar. Uma deambulação muito ingrata entre pedras espalhadas numa grande bandalheira no escuro, debaixo das torrentes daquela bátega. Voltámos a contornar muros e os meus butes eram fraquitolas, na verdade, para lutar com valadas, terríveis...Eu passava-lhes no meio e tropeçava, caí duas vezes...Mas lá me esforçava por continuar assim mesmo de passo certo: Aumm! Dois!Aum! Dois!...
O Meheu estimulava-nos, escoltava-nos de lanterna a dar a dar ao longo da fileira...e tudo isto cheio, ainda por cima, de comentários e facécias impagáveis.
-Diz-me lá tu, magala, se esta volta de gato preto não é mesmo boa? De gato molhado? De gato morto! E não estás a gramar estas bombas de água? Não gostas, diz lá, deste quartel? Não te enche as medidas? O quê, nem um dente à mostra? Tudo isso é neura? Não reparas em nada, nesta categoria? Não estarás feito num oito, por acaso? Não me-lo digas! Ainda te não apetece fugir? Olha que ainda me partes essa cabeça! Espera! Espera! O passo certo! Direita volver! Direita volver! Amanhã vais só ver! Tens esse cu em frangalhos! Oh!Oh!Oh!
E tudo gozava, minha gente.
-É carne para canhão! Garante o Governo. Quando dás por ela já não existes! Já vinhas tísico...


Louis-Ferdinand Céline in De Três Em Pipa. Trad. de Aníbal Fernandes. Colecção Gato Maltês. Assírio&Alvim, 1985., pp. 30/1

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