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domingo, 10 de setembro de 2017

"A ditadura perfeita terá as aparências de uma democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão."


Aldous Huxley

sábado, 9 de setembro de 2017

OS JOVENS FURIOSOS

O século XX,
                          ó grande era do spútnik,
como é grande a tua tristeza e mortificação,
tu - século generoso,
                                       e canalha também, 
século que assassina as nossas ideias,
século de uma juventude furiosa.
Os jovens estão extremamente furiosos.
Os seus olhos brilham de desdém pelo seu tempo.
Desprezam os partidos,
                                                o governo,
a igreja
              e as previsões dos filósofos.
Desprezam as mulheres 
                                                com quem dormem,
o mundo dos bancos 
                                        e escritórios.
Desprezam
                      com dolorosa perspicácia
o seu próprio lamentável desprezo.
O século XX não é pai para eles - mas padrasto.
Detestam-no muito,
                                          enormemente.
E um fermento negro
                                          denso
nos jovens cáusticos junto do Hudson;
e junto do Tibre,
                                 do Sena,
                                                  e do Tamisa
os mesmos jovens passeiam tristemente.
Duros,
              taciturnos,
                                    deformados,
Como se não pertencessem ao seu tempo...
Eu sei bem -
                        o que eles não querem.
Só o que eles querem -
                                                não sei compreender.
Certamente a sua crença jovem
não será apenas
                                praguejar!
De onde estou agora,
                                          em Moscovo,
falo-lhes francamente
                                            de homem para homem:
se alguma coisa me põe furioso,
não é porque em mim
haja uma triste descrença,
mas porque grito alto o amor pelo meu país.
Se alguma coisa me põe furioso -
é porque me orgulho
de estar com os amigos,
                                                de estar nas fileiras,
de estar no combate
                                        pelo meus direitos!
Que se passa convosco?
                                              Procuram a verdade?
'Psicose das massas, ' -
                                               suspiram os psiquiatras.
Jovens vagueiam tristes pela Europa.
Pela América vagueiam jovens tristes.
Ó século XX,
                           ó grande era do spútnik,
arranca-os às sombras e à confusão!
Não lhes dês uma comodidade plácida -
dá-lhes fé
                     na justiça
                                         e no bem.
Eles são teus filhos
                                       e não teus inimigos.
Ouves,
              século XX?
                                    Socorro!


Yevgeny  Yevtuschenko. Antologia da Poesia Soviética. Tradução directa do russo, selecção, prefácio e notas de Manuel de Seabra. Editorial Futura., Lisboa, 1973., p. 160-162

sábado, 27 de julho de 2013

sexta-feira, 1 de abril de 2011

            «...De vez em quando, Agilulfo parava perplexo sem saber se devia comportar-se como quem, só pela sua presença, sabe impor o respeito pela disciplina, ou como quem, encontrando-se onde nada tem a fazer, recua, discreto, e toma um ar ausente. Nesta incerteza detinha-se pensativo e não conseguia tomar nem um nem outro partido. Só sentia que se tornava fastidioso e teria feito qualquer coisa para estabelecer relações com os seus próximos, como por exemplo, pôr-se a gritar ordens; injúrias dignas de um cabo, ou então dizer palavrões e zombar como à mesa de uma taberna. Em vez disso murmurava palavras de saudação ininteligíveis, com uma timidez mascarada de soberba, ou um orgulho moderado pela timidez, e passava adiante. Mas sempre que lhe parecia que os outros lhe dirigiam a palavra, voltava-se e dizia apenas; «Eh?», mas depois convencia-se logo que não era com ele que estavam a falar e ia-se embora como se fugisse.»
 
 
Italo Calvino. O Cavaleiro Inexistente. Tradução de Fernanda Ribeiro. Editorial Teorema, Lisboa, 1998. p. 17/8

''Porque eu não existo, Sire.''

   «Agilulfo deu alguns passos para se juntar a um dos grupos, depois, sem qualquer motivo, passou a outro, mas sem tentar misturar-se, e ninguém lhe prestou atenção. Parou, um pouco indeciso, atrás de uns ou de outros, sem participar nos seus diálogos; por fim, afastou-se. Caía o crepúsculo. No elmo, a pluma irisada parecia de uma única e indistinta cor; mas a armadura branca destacava-se, nítida, ali no prado. Agilulfo, como se de súbito se sentisse nu, cruzou os braços e contraiu os ombros. Depois recompôs-se e, em largos passos, dirigiu-se para as cavalariças.»


 
Italo Calvino. O Cavaleiro Inexistente. Tradução de Fernanda Ribeiro. Editorial Teorema, Lisboa, 1998. p. 11

«Cada palavra, cada gesto eram previsíveis...

«Cada palavra, cada gesto eram previsíveis, assim como tudo naquela guerra, que durava há tantos anos; cada encontro, cada duelo, conduzidos sempre segundo aquele cerimonial, sabendo-se hoje quem é o vencedor de amanhã, quem é o vencido, quem será o herói, quem será o cobarde, quem se fará estripar e quem conseguirá salvar-se depois de ter sido lançado por terra, para fora do arção. Nas couraças, à noite, à luz das tochas, os martelos batiam sempre as mesmas amolgaduras.



Italo Calvino. O Cavaleiro Inexistente. Tradução de Fernanda Ribeiro. Editorial Teorema, Lisboa, 1998. p. 8
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