quarta-feira, 13 de junho de 2018

«Nós não vemos a vida - vemos um instante da
vida. Atrás de nós a vida é infinita, adiante de nós a
vida é infinita. A primavera está aqui, mas atrás
deste ramo em flor houve camada de primaveras
de oiro, imensas primaveras extasiadas, e flores
desmedidas por trás desta flor minúscula. O tempo
não existe. O que eu chamo a vida é um elo, e o que
aí vem um tropel, um sonho desmedido que há-de
realizar-se. E nenhum grito é inútil, para que o
sonho vivo ande pelo seu pé. (...)
   O mundo é um grito. Onde encontrar a harmo-
nia e a calma neste turbilhão infinito e perpétuo,
neste movimento atroz? O mundo é um sonho sem
um segundo de paz. A dor gera dor num desespero
sem limites.

   Eu não sou nada. Sou um minuto e a eterni-
dade. Sou os mortos. Não me desligo disto - nem
do crime, nem da pedra, nem da voragem. Sou o
espanto aos gritos.

RAÚL BRANDÃO, Húmus

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